quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Duas batatas e umas azeitonas em Lamego às 5 da manhã


Esta foto, que retirei do 'site' «Olhares», é da autoria de José Lopes. Sobre ela, alguém comentou que lhe faz lembrar Penude, Lalim e Lazarim e os tempos horríveis que passou nos Rangers. A mim também. Conheço muito bem estas encostas, que repetidamente cheirei, a rastejar...

O que sofri em Cabinda, meus amigos, apesar de tudo e da iminência da morte, nem por sombras me fez sofrer tanto ou sentir fisicamente tão mal como quando sofri o que me fizeram em Lamego. Tortura física. Tortura psicológica em último grau.
Cabinda foi mau. Muito mau. Lamego foi péssimo. Muito péssimo.
Nem que viva 300 anos - e é mais ou menos isso que devo durar depois de Mafra, Lamego e Cabinda! - nunca poderei esquecer o que me fizeram naquelas onze semanas de Penude.
Fui para Lamego fazer o segundo ciclo de instrução, depois de Mafra e um dia em Santarém - como já disse. Mandaram-me para Operações Especiais.
Naquela altura, havia uma espécie de praxe para quem chegava. Na primeira noite, ataram-nos dois a dois e meteram-nos em Unimogs tapados com lona. Chamavam a esta operação a Largada (em Lamego são 11 as operações e cada uma é maior e mais perigosa e dura do que a anterior - e todas têm nomes sugestivos...).
Levaram-nos para distâncias de muitos quilómetros. Deixaram-nos abandonados aos pares, atados, longe uns dos outros lá no meio das serranias, muito longe de Lamego. Nada de comida. Apenas o cantil da água. Havia um aviso: tínhamos de nos desenrascar, desatarmo-nos e estar às sete da matina para o pequeno almoço no quartel, em Penude, uma serrazita a 4 km de Lamego. Era obrigatório chegar juntos ao quartel. Ah, e um alerta muito sério, tipo ameaça: proibido pedir comida, proibido apanhar boleias. Se fôssemos apanhados em falta, não íamos de fim-de-semana durante um mês ou coisa no género.
Lá ficámos, eu e o meu parceiro.
Depois de meia hora, tínhamos conseguido desatar aquela coisa.
Começámos a andar a pé pela serra, em direcção à luz (era meia-noite ou coisa que o valha).
Fartei-me de andar. Claro que me doíam os pés. Claro que amaldiçoei a tropa toda.
Mas lá continuámos.
Aí pelas cinco, finalmente uma casita paupérrima, uma quintazita. Batemos. Vem uma senhora de idade (ou pareceu-nos: aos 20 anos, tudo o que tenha mais de 40 é cota, bem o sabemos).
Pedimos comida. A senhora desculpou-se. Não tinha nada. Só se quiséssemos umas batatas cozidas e umas azeitonas. Sim, claro, fosse o que fosse.
Meus amigos! Que boas que são as batatas cozidas. E se houver azeitonas pretas como aquelas, então são mesmo um acepipe. Experimentem estar nove horas sem comer nada e depois comam duas batatas com azeitonas pretas...
Ainda hoje me lembro do exacto sabor do pequeno almoço dessa matina.
..
Ao longo de toda a vida, quando vejo batatas cozidas, não resisto e peço umas azeitonas, de preferência pretas... e como-as assim mesmo: sem molho, sem azeites, sem nada: só as batatinhas e as azeitonas pretas. Ui!...

3 comentários:

José Carlos Mendes disse...

Foi a minha estreia em Lamego.
Faltou dizer que chegámos ao quartel a horas os dois parceiros.
Como é que isso aconteceu é uma história que deixo para próximo artigo.
Certo?

Anónimo disse...

Gosto muito de Lamego e adoro as festas. eu sou de lá mas mesmo que não fosse ia lá sempre.

Anónimo disse...

Gosto muito de Lamego e adoro as festas. eu sou de lá mas mesmo que não fosse ia lá sempre.